O Julgamento: há 42 anos, Tupi exibia novela baseada em Dostoiévski

Publicado em 10/10/2018

Em 4 de outubro de 1976, a Rede Tupi lançou em seu horário das 20h a novela O Julgamento. Escrita por Carlos Queiroz Telles e Renata Pallottini, a história partia de Os Irmãos Karamazov, de Fiódor Dostoiévski, uma das mais importantes obras da literatura russa e mundial.

Publicado pela primeira vez em 1880, Os Irmãos Karamazov consagrou-se como um dos símbolos do romance russo em virtude de sua narrativa vigorosa, que não se furta ao tratamento de temas polêmicos. Tudo em torno de uma família cujos membros se digladiam entre si.

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A trama central de O Julgamento, transpondo a Rússia para o Brasil

A história se passava na fictícia Feira das Almas – que por pouco não nomeou a própria novela. O centro dos conflitos é a família Paixão, liderada por Lourenço (Cláudio Corrêa e Castro). Péssimo pai e péssimo marido, Lourenço vive às turras com todos. O filho mais velho, Dimas (Carlos Zara), termina por disputar com ele as atenções da bela garçonete Sônia (Eva Wilma). É o que basta para acirrar ainda mais as diferenças entre eles.

Ivan (Adriano Reys), o segundo filho, é um intelectual. Aleixo, o Lico (Tony Ramos), dedica seus dias à vida religiosa num monastério. Ainda, há a figura de Zé Maria (Ewerton de Castro), que sofre de problemas psicológicos. O rapaz fora criado por Lourenço, todavia, não existe amor por ele.

Além de Sônia, há outro ponto de discórdia entre Lourenço e Dimas. A herança de Adelaide (Ruthinéa de Moraes), primeira esposa do primeiro e mãe do segundo. Muito do patrimônio de Lourenço se fez a partir dos dotes adquiridos com seus casamentos. Posteriormente à morte de Adelaide ele se casou com Sofia (Denise Del Vecchio), mãe de Ivan e Lico. Ainda, os dois adotaram Zé Maria.

Quem matou Lourenço Paixão? Mistério no horário nobre da Tupi

A novela começa quando Lourenço Paixão é assassinado. As maiores suspeitas recaem, é claro, sobre Dimas. Era aquele que supostamente possuía mais motivos para dar cabo do próprio pai. Uma série de pessoas de Feira das Almas está implicada nos desdobramentos do crime. Além de Sônia, há também Catarina (Elaine Cristina), inicialmente noiva de Dimas. Mercedes (Cleyde Yaconis), a dona do bar onde Sônia trabalha. Felícia (Lélia Abramo), avó da garçonete. Paulino Lisboa (Henrique Martins), um caixeiro-viajante que desiludiu Sônia amorosamente. Os pormenores do passado da família Paixão, que levaram ao crime, são contados cronologicamente.

Com O Julgamento no ar na Tupi, a Globo exibiu a versão cinematográfica de Os Irmãos Karamazov. Dessa maneira, o grande assassino que a novela teria para revelar foi desmascarado pela concorrente. Zé Maria, o filho adotivo, foi quem matou Lourenço Paixão. Justamente por conta do crime o rapaz vivia ainda mais atormentado, já que via o fantasma do pai.

Os bastidores da escrita de O Julgamento para a Tupi

Tanto Carlos Queiroz Telles quanto Renata Pallottini não eram inexperientes em dramaturgia. No entanto, nenhum deles havia escrito novelas. Foi de Queiroz, publicitário, dramaturgo e professor universitário, a ideia de adaptar Os Irmãos Karamazov. Ele projetou 90 capítulos, um a um, com a história completa, e levou a Carlos Zara, diretor no Núcleo de Novelas. A riqueza do trabalho maravilhou Zara, que aprovou o projeto na hora. Com alguns problemas de coração na época, mais a falta de traquejo no formato novela, Queiroz convidou Renata, dramaturga e poetisa, para dividir o trabalho.

No decorrer da novela, além das dificuldades de produção da Tupi, outras intercorrências atrapalharam o trabalho dos autores. Para que se tenha uma ideia, conforme conta Queiroz em seu livro Tirando de Letra (Best Seller, 1993), Renata e ele se chocaram quando viram todos os cenários em tons marrons, no início das gravações. “E vocês acham que tem outra cor de tinta na Tupi?”, respondeu um funcionário ao ser questionado.

Com efeito, o planejamento minucioso de Queiroz a partir do romance russo não valeu de muita coisa. Os problemas na sucessão do horário levaram Zara a determinar um esticamento de O Julgamento. Os autores chegaram a um ponto no qual nada mais havia a ser contado, no entanto, a novela não podia ainda terminar. Uma reprise de Mulheres de Areia (1973/74), de Ivani Ribeiro, a saber, chegou a ser considerada para ocupar a faixa enquanto se preparava uma nova novela.

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