Bom Sucesso

“Se você mata a cultura, você mata o povo”, diz Lúcio Mauro Filho sobre a censura

Ator fala sobre o futuro de Mário em Bom Sucesso

Publicado em 15/10/2019

Com mais de 25 anos de carreira artística na televisão, no cinema e no teatro, Lúcio Mauro Filho se destaca por sua versatilidade como ator e sua raiz no humor.

Em conversa exclusiva com o Observatório da Televisão, o intérprete do personagem Mário, de Bom Sucesso, fala sobre o futuro do poeta na trama de Rosane Svartman e Paulo Halm, comenta sobre o retrocesso político que estamos vivendo na cultura e revela histórias sobre a sua família.

Confira a entrevista:

Você gostou de voltar para as novelas fazendo um trabalho tão bom como Bom Sucesso?

Bom Sucesso é uma novela com vários signos que aprecio, primeiro uma equipe educada, o que acho primordial nos dias de hoje. Precisamos trabalhar com educação, de um jeito mais parceiro. E esse negócio de grito ficou no passado. Hoje em dia o negócio é falar direito e todo mundo se cuidar. E foi o que eu encontrei nesse elenco, e nessa equipe técnica: pessoas com muito afeto, com muita responsabilidade, com muito carinho com o próximo, e acredito que num ambiente como esse, a possibilidade do acerto é muito maior. A possibilidade do entendimento é muito maior. Então um dos pilares do sucesso de Bom Sucesso com certeza é esse clima lindo nos bastidores.

A Fabiula contou que vocês são amigos há muitos anos. Esse clima de amizade facilita em cena, né?

Muito! Estamos em cartaz há três anos com Cinco Vezes Comédia, rodamos o Brasil, ela acompanhou toda a minha vida e eu acompanhei toda a vida dela. Ela viu a minha filha nascer, eu vi nascer o amor dela pelo Emílio. E as famílias se freqüentam, então quando você vai fazer um trabalho com uma pessoa que tem esse nível de intimidade, você pode emprestar essa intimidade para a cena. Caímos como um par romântico improvável, o Mário apaixonado por ela desde sempre, e a Nana cedendo a esses carinhos e esse jeito atrapalhado, mas super romântico do Mário, então é um tipo de dramaturgia que o romance que é claro, quando existe a química entre os dois atores, você tem meio caminho andado. Qualquer cena do meu personagem relembrando o nosso passado e a nossa amizade, eu não preciso ir para nenhum baú longe de mim, o bauzinho tá ali e a gente traz o bauzinho pra cá, e eu acho que essa verdade e essa sinceridade dos nossos sentimentos que a gente empresta pro personagem, ela imprime na tela. E o público sente.

A cena da Maria Mole e a cena da chuva foram lindas…

Foi uma cena muito doce (risos). Bom, Maria Mole é doce (risos). Foi uma cena muito delicada escrita por Rosane Svartman e Paulo Halm. O texto deles é realmente um primor, é de uma delicadeza que você se sente numa obrigação de fazer o seu melhor para chegar naquele resultado. E foi o que nós fizemos. A Deisy, a nossa diretora, trouxe uma ideia de decupagem de cena, de movimentação muito bonita, a gente entendeu que era o Mário transportando a Nana para um lugar que a Nana está desacostumada a ir, que é um lugar da natureza, do tempo para se curtir, porque ela é durona, uma executiva, que sempre tem que estar resolvendo as coisas. A gente sabe como são essas pessoas no dia a dia, elas têm uma dificuldade muito grande para relaxar, para se desligar dos negócios. Então é uma cena que é uma vitória coletiva. A gente jamais conseguiria chegar naquele resultado individualmente, então é muito bonito quando isso acontece, quando a direção, texto, atores e equipe se encontram e consegume fazer uma jóia rara como a cena da Maria Mole. Eu fiquei muito impressionado com o resultado e o feedback do público, que no dia seguinte foi uma loucura.

Seu personagem é um poeta. Você acha que ele finalmente vai fisgar a Nana?

Olha rapidinho ele não vai conseguir, porque ele está esperando isso há 40 anos. Ele teve a ajuda da Silvana Nolasco, uma pessoa muito acostumada a quebrar a timidez das pessoas, e a Silvana propõe essa maluquice de ele transportar a Nana para uma fábula, uma fantasia. Ele faz e dá certo, então ele dá muita credibilidade pra maluca da Silvana, porque graças às dicas dela, ele consegue dar umas bitoquinhas na Nana (risos).

Mas ele também sai com a outra. Como fica isso?

O que acontece é o seguinte: a possibilidade do cupido se apaixonar pelo motivo do trabalho é grande. Eu digo isso com um conhecimento de causa, porque eu fui um cupido da minha mulher com um grande amigo meu, e quando eles terminaram o namoro deles, eu fiquei com aquilo na cabeça, eu falei ‘cara, eu falei tão bem dessa mulher, eu insisti tanto pro cara ficar e ele não ficou, será que fico eu?’, e cá estamos nós, 21 anos de casados. Cuidado, Nana! (risos)

E quem vai ser o pai do filho da Nana? Mário ou Diogo?

Eu não sei quem vai ser o pai, mas eu adoto e o escambal. Pai é quem cria. Eu nem vi essa criança e já me afeiçoei. (risos)

Você tá num momento especial da sua carreira, porque o público está te vendo em três facetas diferentes, inclusive num papel que já foi do seu pai na Escolinha. Isso é bem bacana pro artista, né?

Isso é um sonho para cada artista, poder mostrar diferentes facetas, poder experimentar diversos tipos de interpretação, mas de dramaturgia também, e acontecer uma coincidência como essa, é realmente muito especial, a sensação que eu tenho é que eu estou falando pra gente de todas as idades, de todos os status sociais, pra gente de tudo quanto é jeito. O sonho de todo artista, é ir onde o povo está, como diria Milton Nascimento.

Recentemente o país passou por uma situação muito triste na Bienal. E seu personagem é um escritor. Como você lidou com isso?

Para a gente foi muito louco, porque além de tudo, nós gravamos na Bienal. Entristece, mas não assusta. A cultura foi escolhida como um dos setores a serem combatidos. O que essa gente que coloca o povo contra a cultura não entende que a cultura é o povo. Se você mata a cultura, você mata o povo. O povo não resiste sem cultura. A cultura faz parte de cada um de nós, faz parte da paleta de cores que nós temos como seres humanos, brasileiros, como índios, imigrantes, negros, é essa mistura linda que faz o Brasil. Então quando você ataca a cultura, você ataca a diversidade, você ataca o jeito amistoso do brasileiro ser e de receber o mundo aqui dentro, então é isso que quem luta contra a cultura não entende. Da mesma forma que foi muito violenta, a resposta também foi muito forte. E é bom que eles entendam. Se tem uma coisa que vai unir o povo é a cultura, e nunca separar.

O que significou para você a chegada de sua nova filha?

Foi um rito de passagem pra gente, uma coisa muito diferente, muito inesperada. Obviamente não foi uma coisa planejada, então dá uma sacudida na vida e, claro, quando vem um bebê inesperado a gente tem que tentar entender os sinais que vem com essa vida. Uma vida quando vem desse jeito, ela vem recheada de sinais, então é isso que a gente procurou buscar e entender os sinais pra gente enquanto pais, pros nossos filhos, então a gente entrou nessa brincadeira juntos, o fato das crianças estarem com 15 e 14 anos, eles são segundo pai e segunda mãe, a gente não tem babá, numa vida corrida como essa como é que não tem babá? É porque tem Bento e Luísa, que são segundo pai e segunda mãe, que dão banho, trocam fralda, que fizeram curso na maternidade, que botam pra dormir, então um bebê que vem e traz essa sabedoria, e vem pra unir… Então é pra isso que vem a vida, vem pra unir!

Isso é um pouco parecido com o que vai acontecer com a Nana, né?

Tem bastante coisa da Nana na minha vida. Por causa do meu pai, por causa da peça. Muitas coisas eu conversei com a Fabiula na preparação da novela, nessa coisa de segurar a família, de querer resolver tudo, e daqui a pouco você se sentir sobrecarregado, então toda essa experiência eu vivi agora no começo da novela. Pude conversar com a Fabiula, passar a experiência que eu tive pra ela, então até nisso a preparação da novela foi muito especial. E aí continua essa coisa da maternidade, do filho que vem inesperado, que te pega de sobressalto, então quer dizer, o cara além de ser ator traz material para as pessoas (risos).

Seu jeito de ser sempre foi assim muito humilde. Você fala com todos, é divertido. O que você acha disso?

Eu acho que se você está mal, muito mal humorado, é melhor nem sair de casa. Se você tem que trabalhar, e lidar com as pessoas, eu acho que você tem que ter uma sabedoria de entender que todo mundo passa por problemas, que de repente seu problema é grande, mas tem outra pessoa com um problema talvez maior quanto o seu. E sempre vai acontecer. A vida é sofrida pra todo mundo. Todo mundo perde parente o tempo todo. As pessoas perdem empregos e outras coisas. Então eu procuro enxergar o lado bom da vida. Na hora do sofrimento eu sempre procuro enxergar as coisas boas pra botar numa balança e ficar equilibrado. Saber que de repente tem uma tristeza, mas tem um monte de alegrias. A vida é muito sábia. O universo é muito sábio. Olha minha experiência: o meu velhinho foi embora, mas tá chegando um bebê. Então poxa vida… Se o cara não entender o sinal desses, o cara pode se perder mesmo. Então pra não me perder eu procuro a compaixão, a educação, e entender que por maior que seja o meu sofrimento, pode ter alguém com um sofrimento maior que o meu.

Como o Mário vai lidar com o Diogo em Bom Sucesso a partir de agora?

Vai lidar com o mesmo jeito que ele lidou sempre. Com muito medo, e agora ele entendeu mais do que nunca que o cara não tem limites. Mas ao mesmo tempo, a força do amor que ele tem pela Nana eu acho tão fantástico, que deixa ele até corajoso.

Você acha que tem mais gente desconfiado que o Diogo não presta?

Eu acho que já tem gente sabendo, o William, o Mário, acho que até o próprio Marcos. Mas acho que o Mário meteu os pés pelas mãos na hora de falar sobre esse atentado, e pior do que isso, ele escolheu a pior testemunha que ele poderia trazer, que é a maluca que queimou todos os livros, então ele comete esse erro, ele leva a Silvana achando que vai resolver alguma coisa.

Qual o seu ship com a Nana na novela?

O shipado com a Nana é o Nanário. O problema é quando surgir o Silvário. E o Mário está amando. Ele era um cara super subestimado e agora está pegando duas deusas. Chupa, Rômulo Estrela!

*Entrevista feita pelo jornalista André Romano

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