“O processo de gravação foi muito intenso”, afirma Paulo Rocha sobre Se Eu Fechar Os Olhos Agora

Publicado em 01/04/2019

Atualmente no elenco de O Sétimo Guardião, o ator Paulo Rocha também aparecerá na TV Globo na minissérie Se Eu Fechar Os Olhos Agora. Ele será Joel, um açougueiro que perdeu a mulher e não consegue dar amor ao filho, Paulo (João Gabriel D’Aleluia). Em entrevista ao Observatório da Televisão, Paulo falou sobre a mudança radical que teve para seu personagem e que inclusive ficou irreconhecível. Confira:

Que transformação foi essa para esse personagem?

“Eu raspei a cabeça. Quando eu li o personagem, eu achei que tinha que ser uma coisa bastante diferente. Porque tudo que ele faz é tão difícil, é uma pessoa tão distante de mim e com uma aridez interior tão grande. A gente seguiu debatendo a ideia, por todas as questões de dificuldade e produção. Mas para dar espaço para entrar o Joel, era preciso sair o Paulo. Para que ele pudesse aparecer em toda a sua essência, era necessário que não tivesse nenhuma identificação.”

Vilão

Em Totalmente Demais você também fez um vilão, mas esse é mais difícil?

“Não, esse aqui foi o mais claro. O ponto de partida é muito bom, é muito claro. É muito bom porque tivemos a sorte de ter uma equipe que bancou umas escolhas nossas bem loucas. Por exemplo o risco de cortar esse cabelo, eu prometi para o Manga que até o seriado estrear eu ficaria de boné, justamente para a gente conseguir ter esse efeito agora.

A gente fez preparação, fez ensaio de figurino e toda vez que eu olhava no espelho, eu sentia que estava faltando alguma coisa. Quando a gente tirou, o que faltava para o Joel existir, aconteceu naquele momento. Eu estou falando e estou arrepiado, porque o processo foi intenso. Ele é tão pungente, tão vivo, tão claro naquilo que ele é, que foi só olhar e ler.”

Como foi atuar com o João Gabriel?

“A gente é apaixonado até hoje, o João e o Eike eram os meus bebês e eles cresceram. Até durante as gravações eles cresceram.”

Gravações

Como foi maltratar eles sem ser rude?

“Justamente isso, acho que nosso trabalho é muito louco por isso. A gente tem que ter uma percepção muito boa de quem a gente é, de quem a gente vai retratar e se abstrair disso. E dar espaço a entrar outras coisas, porque eu sempre tenho essa ideia de que fazer um vilão, é um trabalho de ensino mais importante do que fazer um herói.

Quando eu faço os vilões que me são propostos, eu procuro sempre mostrar ou pelo menos pensar que a pungência e a intensidade que a gente vai mostrar, ela tem o mesmo poder de ensino. O ser humano tem tendência para o caos, para a destruição. A gente vive em sociedade com regras, para não nos permitir entrar na selvageria.”

Você está cada vez com menos sotaque, você trabalha nisso?

“Pois é. Eu trabalhei muito durante os primeiros anos aqui, hoje em dia eu ainda trabalho com a Leila, mas não é um trabalho especifico de sotaque. É uma coisa mais de voz, mas desde Fina Estampa que a proposta para eu ficar aqui, seria justamente a gente fazer esse trabalho de trazer o sotaque de português do Brasil. A partir daí, eu comecei a fazer esse processo como um work in progress, eu deixei de falar português de Portugal, só falo por uma questão de respeito com o meu pai quando eu falo com ele e alguns amigos de Portugal.”

Novos olhares

Você acha que o público e os diretores vão te ver diferente com esse novo personagem?

“Eu espero que eles vejam o Joel com outros olhos, eu estou aqui para tentar criar uma visão de mundo, um personagem e um olhar de mundo a cada personagem que me dão. Às vezes esses processos que tem uma pegada mais racional, a gente lê o texto e de maneira que aquelas palavras estão organizadas. Nos remete algumas lembranças que a gente possa ter, seja através de livros ou filmes e ao mesmo tempo é tentar perceber as motivações daquela pessoa. O importante é a gente ter a percepção de que o ser humano é capaz das maiores atrocidade, qualquer um de nós.

Pressionados na hora certa e no momento certo, até o melhor ser humano do mundo é capaz das maiores atrocidades. Partindo daí, isso já te liberta de alguns preconceitos que você possa ter até com você mesmo. Com essas referências que você tem, você ter a liberdade de tentar criar o olhar que aquele personagem tem sobre o mundo. Você tem que olhar o que pode ter acontecido a uma pessoa, para que isso seja possível. Às vozes que falaram nele, as vozes da cultura, da sociedade. O que isso reflete, o que isso faz, mas isso tem um preço. Isso te leva fazer uma série de atrocidades.”

Consciência

Você ficava com a consciência pesada depois das cenas ou carregado?

“O processo de gravação foi muito intenso e eu acho que transpira na cena, foram dias de gravação muito difíceis, muito intensos para todos nós. É interessante porque quando você está fazendo um projeto, você tem a sorte disso acontecer, de você criar uma atmosfera especifica durante algumas horas, em que está todo mundo na mesma respiração.

Quando a gente vê um bom filme, durante um tempo a gente é tingido por aquilo que o filme te passa e isso aconteceu muito. A segunda vez que eu fui para gravar outras cenas assim, deixa um dor dentro do Paulo. Tem um pulsar, que não é o pulsar do Paulo, mas as coisas ficam e é doloroso. Porque você se entrega, se abre e se doa.”

Pai

O que você já aprendeu nesse quase um ano sendo pai?

“Antes de você ser pai tem uma coisa que se torna um pouco assustadora. Quando você fala isso para alguém que já é, a pessoa fala que é a melhor coisa do mundo, que a vida vai mudar. Mas ao mesmo tempo você pensa ‘será que eu não tenho empatia?’, eu não acho que isso vai acontecer comigo. Na verdade, a gente só tem consciência daquilo que vai perder, não tem consciência daquilo que vai ganhar ao se tornar pai.

Desde muito tempo atrás, a gente vive sobre essa ilusão de que o racional consegue resolver tudo, é mentira! Porque quando o Zé Francisco me caiu nos braços, a minha vida mudou. Eu mudei sem me dar conta. Eu falo para vocês que é difícil, não tem nada melhor. Mas antes de ser pai eu não tinha como levantar essa bandeira e falar isso.”

*Entrevista feita pelo jornalista André Romano.

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