“Dois corpos não ocupam o mesmo lugar”, define Adriana Araújo sobre o período quando perdeu a bancada do JR para Ana Paula Padrão

Publicado em 07/09/2017

Adriana Araújo começou a carreira na televisão em Belo Horizonte, mas chamou atenção, de vez, em Brasília, quando cobriu os bastidores do poder. Atualmente, é o principal nome do jornalismo da Record TV. Apresenta o noticiário mais importante da emissora e é a âncora mais preparada para coberturas de eventos ao vivo e entrevistas importantes.

Se, já na infância, ela tinha o sonho de ser repórter, ela já pode dizer que possui uma carreira de sucesso. A jornalista impressionou a Record TV quando ainda era repórter da Globo na Capital Federal. O convite para ser âncora foi, de fato, uma virada na vida profissional e pessoal de Adriana.

Em entrevista exclusiva ao Observatório da Televisão, ela revelou que brincava de ser repórter na infância, alimentando o sonho de trabalhar na TV, e ressaltou a emoção de narrar em tempo real o resgate dos mineiros chilenos.

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A jornalista detalhou, ainda, a adrenalina que sentiu na primeira entrada ao vivo no Jornal Nacional e o sentimento ao deixar à bancada do Jornal da Record, em 2009, quando Ana Paula Padrão foi contratada. Adriana, inclusive, aproveita para esclarecer se houve ou não rivalidade entre ambas.

Ao longo da entrevista, a mãe de Giovanna falou sobre a importância de ter sido correspondente em Nova York, das reportagens em Olimpíadas, eleições, grandes acontecimentos, e o retorno bem-sucedido à bancada. Ela sabe que é uma formadora de opinião e explicou qual é o tamanho dessa responsabilidade em um país complexo como o Brasil.

Consolidada na Record TV, Adriana não descarta futuramente deixar o jornalismo e fazer algo no entretenimento, mas, por enquanto, está feliz sendo “funcionária da notícia”, como costuma dizer.

Confira abaixo a entrevista completa.

Há tantos anos na TV, qual é sua primeira imagem da televisão? Se lembra de algo marcante durante a infância?

Viajei no tempo agora! E me vieram duas imagens: o Michael Jackson e o Silvio Santos. Eu brincava de fazer televisão imitando os programas do Silvio, ora como apresentadora, ora como jurada ou cantora. Com minhas irmãs e primos, a sala de casa virava um estúdio de TV.

Em 1982, quando o Michael lançou Thriller, eu tinha 10 anos e fiquei vidrada. Daí o Michael entrou na brincadeira porque não dava para brincar de fazer TV sem imitar o Michael.

Só mais tarde, por volta de 14 anos, o martelo de cozinha que fazia as vezes de microfone foi usado para imitar as jornalistas que eu via no noticiário com meu pai e, assim, comecei a me ver no papel de repórter.

Quase 30 anos depois cobri a morte do Michael Jackson e entrevistei o Silvio Santos. Foram dois momentos marcantes para mim.

O que você pensava sobre trabalhar na televisão antes de fazer parte dela?

Sempre fui fascinada por televisão. Mas nunca só por assistir, sempre me via fazendo parte daquele mundo. E nunca achei que era algo distante, impossível. Eu apenas dizia: “um dia vou fazer um Globo Repórter”; “um dia vou viajar fazendo grandes coberturas”. Meus pais – um metalúrgico e uma dona de casa sem qualquer contato com esse meio – imaginavam que eu estava sonhando longe demais.

E aconteceu como eu imaginava. Fiz algumas vezes o Globo Repórter e aqui na Record viajei para dezenas de países fazendo as melhores reportagens da minha carreira. Nunca idealizei só glamour e sucesso. Imaginei trabalho mesmo, pesado, mas, ao mesmo tempo, vibrante como a TV realmente é.

Tem uma história engraçada. O salário família que meus pais receberam quando eu nasci foi usado para comprar o primeiro aparelho de TV da nossa casa. Minha mãe diz que já era um sinal do destino.

E a televisão mudou muito desde que começou? O que mais se transformou?

A tecnologia mudou completamente. Falando baixo, aqui entre nós, comecei como estagiária da Globo usando máquina de escrever, papel carbono e mimeógrafo. Tem gente que não faz ideia do que seja um mimeógrafo hoje. E essa mudança tecnológica deu agilidade à TV, melhorou a captação de imagens e sons, a edição, tudo.

A linguagem também mudou. O jornalismo na TV hoje é menos engessado, sotaques podem aparecer, a emoção do repórter em algumas situações, também. Cada um tem a liberdade de contar uma história a seu modo.

Antes era tudo mais robótico e hoje bem mais natural. Nesse caminho só não gosto da banalização do uso de gírias. Acho que podemos escrever e contar as histórias em bom português, usando gírias eventualmente quando for conveniente ao assunto, não apenas porque parece moderninho.

Durante o seu começo na televisão, que ensinamentos, quais experiências foram importantes para o que você é hoje?

Um dia, ainda estagiária, escrevi uma nota sobre um acidente. Um motoqueiro tinha caído dentro de um rio em Belo Horizonte e foi içado de lá pelos bombeiros com algumas costelas quebradas. Escrevi assim a nota: “Tragédia no rio Arrudas em Belo Horizonte” e narrei o ocorrido. Minha chefe me perguntou: “O dia em que um ônibus com 40 passageiros cair no rio e várias pessoas morrerem que palavra você vai usar? Você já gastou a palavra tragédia”. Uma lição simples, mas valiosa demais.

Entendi perfeitamente que cada palavra tem seu significado, seu peso e que não faz qualquer sentido exagerar nos termos pelo puro sensacionalismo. Lição que precisa ser mais praticada hoje em dia. E a maior de todas as lições: você é responsável por toda informação que leva ao ar. Então, apure, apure, apure, incansavelmente. Isso define a competência de um jornalista.

Você se lembra da sua primeira reportagem? Do seu primeiro ao vivo? Sentia fria na barriga?

Nos primeiros pilotos como repórter, eu não tinha noção alguma. Usava batas hippies e estampadas, cabelo rebelde e tremia muito. O microfone pesou na mão, eu tinha só 21 anos. Mas como fui editora antes de me tornar repórter, aprendi muito com os acertos e erros dos colegas. Assistia a absolutamente tudo, acordava e dormia assistindo aos telejornais. Quando efetivamente me tornei repórter estava mais segura.

Tanto que me tornei repórter do Jornal Nacional sem ter sido repórter dos telejornais locais antes. E a primeira entrada ao vivo a gente nunca esquece. Era sobre a noite de Natal, a iluminação na praça da Liberdade em Belo Horizonte. Estava calma, mas como era a minha primeira vez e logo abrindo o JN, falaram tanto que eu não podia errar que senti a pressão. No ar foi tudo ótimo, sem erros nem gaguejadas. Mas, quando terminou, sentei no chão da praça e chorei porque a adrenalina é muito alta.

Mas não ficou qualquer trauma. Pelo contrário, o que mais gosto de fazer na vida é ancorar um telejornal ao vivo, sem teleprompter, sem texto, no improviso como faço hoje nas grandes coberturas do Jornal da Record. Foi assim nas Olimpíadas do Rio (2016), no Impeachment de Dilma Rousseff (2016), na posse de Donald Trump (2017). Para mim, esses são os melhores momentos do trabalho, quando você realmente mostra que sabe fazer TV e não apenas ler as notícias.

Você cobriu Brasília em outros tempos. Qual é a importância de ter acompanhando o centro do poder para sua formação profissional? 

Transformador, para o bem e para o mal. Para a cidadã Adriana, Brasília foi um banho de desilusão. Quando você entende e vê de perto todos os conchavos, as negociatas, os inimigos de ontem se abraçando hoje e o interesse público a quilômetros de distância de tudo isso, dá uma desesperança.

Mas, profissionalmente, atuar como repórter em Brasília mudou a minha carreira. Quando você cobre o poder, sua capacidade de apurar as notícias é testada a cada minuto. Uma informação errada e cabeças podem rolar. A palavra credibilidade ganha outra dimensão, a maneira como você se prepara para cada entrada ao vivo, tudo é cercado de muito mais pressão e expectativa.

Se a entrada ao vivo de Natal parecia adrenalina, imagina ancorar ao vivo o escândalo do mensalão com informações verdadeiras e fofocas surgindo a cada instante? E você ao vivo, apurando nos intervalos, correndo atrás das fontes, buscando furos. Foi essa experiência que vivi em Brasília que me tornou âncora na Record.

Em janeiro de 2006, você apareceu para o Brasil como âncora, em uma grande reformulação do jornalismo da Record. O que te motivou a assumir uma bancada? Foi um desafio em que sentido?

Tinha um motivo pessoal: minha filha, Giovanna, precisava de um tratamento médico, com várias cirurgias que só poderiam ser feitas em São Paulo. Aceitei, antes de tudo, por ela. As condições que a Record me oferecia eram muito favoráveis para que eu pudesse dar à minha filha o que ela mais precisava.

E, claro, tinha o desafio profissional. Eu não era âncora na Globo. Mas a escola de entrar ao vivo em Brasília, no meio do mensalão, me preparou para o passo seguinte. Tive a confiança da Record e todo apoio do meu companheiro de bancada, Celso Freitas, um amigo e professor, gentil e elegante, sem estrelismos, como poucas pessoas na TV.

Apesar de estar na bancada, você costumeiramente faz reportagens, sai às ruas. A reportagem é ainda sua grande paixão?

A notícia é minha grande paixão. Quando vou para rua fazer as grandes coberturas, as transmissões ao vivo, fico animadíssima. As pautas que chamamos de reportagens mais “frias” que não precisam necessariamente entrar naquele dia ou naquela semana não me animam tanto. Gosto mesmo é da adrenalina, não dá para negar. Se me mandam para o olho do furacão, em vez de assustada, fico feliz. E, acredite, não acho que seja patológico. Costumo dizer que sou funcionária da notícia.

Em 2009, você saiu da bancada para ser correspondente internacional. Você fez reportagens memoráveis para o público. Mas, para você, quais coberturas te encantaram mais?

A chegada da Ana Paula Padrão à bancada do Jornal da Record foi um momento de grande aprendizado para mim. Testei ali uma lei da física: dois corpos não ocupam o mesmo lugar. Mas, por outro lado, um mesmo corpo não ocupa todos os lugares. Bastava olhar para as oportunidades ao meu redor. Se eu ficaria longe da bancada, estava livre para viajar pelo mundo.

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E, assim, fui para Nova York e depois para Londres como correspondente e estive em vários outros países para coberturas especiais como a Coreia do Sul, México, Canadá, Egito, Israel. Botei rodinhas no pé e segui em frente.

Mas as duas coberturas mais marcantes foram o terremoto do Japão em 2011 – pelas condições adversas de trabalhar sem comida, sem água e sem dormir – e o soterramento dos mineiros, no Chile, em 2010. Narrar ao vivo a alegria das famílias durante o resgate dos 33 mineiros foi uma das maiores emoções que vivi como repórter. Inesquecível!

Muita gente tem curiosidade de saber como é a vida de uma correspondente internacional. Como era sua rotina em Nova York? O processo de adaptação foi uma questão?

É muito corrido nem dá para pensar muito nessa tal adaptação. Cheguei em Nova York na semana da morte do Michael Jackson e apenas trabalhava 16, 18 horas por dia. Quando me assustei já estava com as engrenagens aceleradas. Minha filha também se adaptou com facilidade.

E, na rotina como correspondente, aprendi a estar com o radar sempre ligado. A qualquer momento, nos Estados Unidos, uma notícia pode repercutir no Brasil e no mundo inteiro. Isso te deixa sempre alerta. Foi um grande aprendizado também.

Quando deixou a bancada do Jornal da Record, algumas publicações especularam uma rivalidade com a nova âncora, a Ana Paula Padrão. Existiu algum desconforto? Como é sua relação com ela?

Nunca neguei que a saída da bancada foi difícil para mim. Mas, como já disse, foi também uma experiência de renovação, de reinvenção profissional. E foi a chegada da Ana que me permitiu viver isso.

Sobre a boataria de brigas e rivalidade, isso é pura invenção. Dividi a bancada com a Ana algumas vezes no JR, nas olimpíadas em Londres, fizemos juntas a primeira entrevista exclusiva com a Dilma Rousseff eleita presidente em 2010 e sempre trabalhamos superbem juntas. Em toda oportunidade que tivemos, foi uma boa troca profissional, pelo menos para mim. Espero que tenha sido para ela também.

Por outro lado, quando você voltou, a audiência do JR e o mercado publicitário comemoraram. Você imaginava que é tão querida? Quando e como você percebeu que é famosa?

Fiquei muito feliz quando os resultados positivos na audiência surgiram logo após a minha chegada. Quem não ficaria? Recebi mensagens pelas redes sociais, as pessoas me paravam na rua para dizer “que bom que você voltou”. Isso me deu uma ótima energia para retomar a trajetória como âncora.

Mas acho que o público sentiu saudade da dupla que foi separada em 2009. O Celso e eu temos uma química bacana no ar, uma parceria verdadeira. Somos bem diferentes, temos trajetórias profissionais distintas, mas nos completamos bem. Ele tem a credibilidade e a seriedade com a notícia que me inspiram muito.

Eu, por ter vindo das reportagens na rua, das entradas ao vivo, tenho um gosto maior pelo improviso, para contornar situações inesperadas. E, assim, nos entendemos bem. O público sente que entre nós existe um respeito verdadeiro, sem competição ou vaidades.

Ainda sobre o JR, como são os bastidores do jornal, sua relação com o Celso Freitas?

Bom, pela última resposta, acredito que todos já entenderam que o Celso não só ocupa a cadeira ao meu lado na bancada, como tem um lugar no meu coração. Sempre terá.

Ele é muito sério no ar mas nos bastidores faz a gente rir, com piadas e vídeos engraçadíssimos. A gente se diverte com ele no camarim. Em tempos de notícias tão pesadas, é bom conviver com um sujeito tão bacana quanto o Celso.

Você é a âncora principal da Record TV para eventos ao vivo. Tem jogo de cintura, segura longas jornadas sem se deixar levar pelo senso comum. Qual é o segredo para ser tão livre do TP? Você se prepara muito?

Para as grandes coberturas com data marcada como eleições, votação de impeachment, eventos esportivos, são horas e horas de leitura, pesquisa sobre os assuntos, conversa com fontes, com os editores e produtores que me agregam muita informação.

E tenho uma técnica de memorização – tomo muitas notas, escrevo os dados e informações mais relevantes. Mas na hora de entrar ao vivo não tenho nem TP, nem qualquer papel nas mãos. Apenas tento passar para o público todas as informações que levantei da forma mais clara e natural possível. E acho que funciona bem.

Em casos como a transmissão do funeral das vítimas do voo da Chapecoense, por exemplo, encontrar o tom adequado, respeitoso e informativo, ao mesmo tempo, é o desafio. Cair no senso comum, nos chavões, na espetacularização são armadilhas fáceis. Tomo muito cuidado para fugir sempre disso.

Já quando notícias inesperadas surgem durante o jornal, como as gravações das conversas do presidente Temer ou um atentado terrorista, por exemplo, isso muda o espelho [programação das reportagens que vão ser exibidas no jornal] inteiro do JR. Nesses momentos, é hora de aplicar a experiência acumulada em 23 anos de TV e muita calma. São jornais bem mais desafiadores, tensos, mas gosto muito de fazer jornalismo assim: aconteceu agora e é relevante, tá no ar! Essa é a missão de um âncora.

Até 2017, você já cobriu várias editorias, eventos esportivos, eleições, foi correspondente internacional, fez reportagens em vários países e está em uma bancada. O que você gostaria de fazer na televisão que ainda não teve a chance?

Cantar. Vale essa resposta? Recentemente, estive no programa do Porchat e falei que vou ensaiar para cantar com a banda dele. Vai que ele me convida…

Agora no jornalismo, enquanto eu for funcionária das notícias, elas me guiam. Mas não descarto, no futuro, partir para algum projeto na área do entretenimento.

Ao longo dos anos, você se tornou uma formadora de opinião. Qual é o peso dessa responsabilidade em um país como o Brasil? 

Nesse momento, é gigantesca essa responsabilidade. Num momento de crise política como vivemos é fácil ganhar popularidade e seguidores nas redes fazendo o discurso de que todo político é bandido, temos 513 patifes na Câmara e 81 no Senado, que temos que acabar com a política. Sim, temos muitos patifes em Brasília.

Mas generalizar é equivocado, para não dizer irresponsável. Como todo brasileiro, quero todos os corruptos condenados, na cadeia, pagando pelos crimes que cometeram e devolvendo o dinheiro que roubaram. A corrupção no Brasil é vergonhosa, escandalosa, inaceitável. Ninguém aguenta mais.

Mas, por outro lado, criminalizar a política não melhora o país. Existe outra maneira de viver em sociedade que não seja debatendo e decidindo nossos caminhos por meio dos representantes que escolhemos? Sem democracia, sem política, só vejo o caos.

Nós brasileiros teremos que ser maduros para tentar separar o joio do trigo, escolher melhor, votar e acompanhar o trabalho de quem elegemos. Não vejo outra saída e temo muito os discursos radicais e vazios que vejo surgindo no horizonte.

Na sua opinião, o que falta no telejornalismo brasileiro?

Acho que estamos num momento de reinvenção. TV não é mais o aparelho pendurado na parede da sua sala. TV é o conteúdo que produzimos e que o telespectador vai assistir no celular, tablet, notebook e também no aparelho de tv. Precisamos pensar adiante para conquistar esse público novo que quer informação, mas que é muito acelerado, está acostumado com o ritmo das redes.

Acho que ninguém ainda encontrou essa fórmula. Temos discutido isso, mas também sabemos que o telejornalismo não pode perder sua essência: a credibilidade. Qualquer informação que circula nas redes e que deixa as pessoas em dúvida logo elas pensam: será que é verdade? Será que vai mostrar na TV? Isso é muito valioso.

Você assiste televisão? O que mais gosta de ver?

Até hoje, notícia. Devido à minha rotina, assisto mais pela internet, mas sempre vejo os principais telejornais. E vejo séries, mas fujo das viciantes. Como jornalista e mãe não posso me permitir virar a madrugada, devorando um episódio atrás do outro. Chef´s Table, eu amo! Dá para assistir, degustar com calma.

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