Cidade dos Homens é reprise requentada, mas tem seus méritos

Publicado em 17/01/2017

Não seria nenhum exagero apontar Cidade dos Homens, série que a Globo exibiu entre 2002 e 2005, como uma das principais séries de sua história. Desdobramento de Palace II, episódio exibido na série Brava Gente, em 2000, a trama que narrou as aventuras de Laranjinha (Darlan Cunha) e Acerola (Douglas Silva) surgiu em plena efervescência do cinema nacional calcado no “favela movie”, e é considerada “parente” do longa Cidade de Deus, que fez história no Brasil e no mundo.

O grande trunfo das quatro temporadas originais de Cidade dos Homens (todas curtas, compostas por quatro ou cinco episódios) é a verdade impressa no roteiro assinado por grifes como Fernando Meirelles, Jorge Furtado, Kátia Lund, Paulo Lins, George Moura, Paulo Morelli, Newton Cannito e Regina Casé, entre outros. Verdade no trato do cotidiano da favela, tomada não apenas pelo tráfico e pela violência, mas também pelo dia-a-dia de gente honesta e trabalhadora. E verdade no trato da passagem pela adolescência, quando o jovem passa a viver os dilemas típicos da fase em que a vida adulta bate à porta. Laranjinha e Acerola eram jovens que viviam numa comunidade, vivendo conflitos típicos do ambiente, mas também típicos da idade em que se encontravam. Entre 2002 e 2005, ambos cresceram diante do público, permitindo com que cada temporada narrasse um momento do desenvolvimento de ambos.

Por conta da competência do roteiro e da direção da equipe da O2, de Fernando Meirelles, Cidade dos Homens deixou a sua marca e contou, sempre, com a boa receptividade do público a cada safra de episódios. A atração ganhou ainda um longa-metragem, que funcionou como uma espécie de conclusão da saga dos dois rapazes. Mas tal conclusão não se mostrou definitiva, já que uma nova temporada da série foi lançada pela Globo. Com quatro capítulos exibidos até sexta-feira (20), a série retorna com a premissa de mostrar como estão, hoje, Laranjinha e Acerola, e ainda relembrar importantes passagens das temporadas anteriores.

Ou seja, na prática, a nova temporada de Cidade dos Homens nada mais é que um prato requentado. No episódio de estreia, o público foi apresentado à vida atual dos protagonistas, e também conheceu os filhos de ambos, Davi (Luan Pessoa) e Clayton (Carlos Eduardo Nascimento), que repetem a amizade e o companheirismo de seus pais. No entanto, a maior parte do capítulo foi dedicada às lembranças dos protagonistas, que reviveram momentos importantes da adolescência. Dois episódios da terceira temporada, “Foi Sem Querer” e “Pais e Filhos”, foram condensados em flashbacks ao longo do capítulo de estreia, rememorando importantes momentos de Laranjinha e Acerola. Nas memórias, este último reviveu os tempos em que descobriu que seria pai na adolescência, enquanto o primeiro procurava saber quem era o seu pai. As memórias faziam um paralelo com o contexto atual da série, no qual Laranjinha sofre ao ver seu filho enfrentando uma grave doença.

Outras passagens das temporadas anteriores de Cidade dos Homens serão relembradas ao longo dos dois próximos episódios da atual safra, e apenas o último terá uma história totalmente inédita. Mas, mesmo sendo uma reprise requentada, a nova temporada de Cidade dos Homens mostra-se uma ótima atração, já que traz de volta dois personagens emblemáticos, passados mais de dez anos da conclusão da série original. Com isso, dá a chance ao público de reencontrar duas figuras já velhas conhecidas, tendo a oportunidade de mostrar onde a vida os levou. E o repeteco que embala este encontro ajuda a audiência a relembrar, afinal lá se vão 12 anos, e ainda pode ajudar um espectador novo a se situar. Além disso, toda a trama original que emoldura tais flashbacks mantém intacta a qualidade de roteiro, direção e atuações, uma marca da produção.

Ao que tudo indica, a onda de relembrar séries originais passados tantos anos após suas conclusões é uma tendência mundial. Nos EUA, por exemplo, clássicos como Full House (Três É Demais) e Gilmore Girls (ou Tal Mãe Tal Filha) ganharam temporadas novas anos depois de seus términos, mostrando ao público como estão hoje personagens antológicos. Arquivo X e Heroes foram outras séries que ganharam sobrevida anos depois, e logo deve estrear também uma nova temporada da clássica Twin Peaks. O Brasil não tem um histórico de séries tão marcantes a ponto de suas retomadas causarem tanto frisson, mas não é impossível que alguns revivals aconteçam. Antes de Cidade dos Homens, o público brasileiro já teve a chance de reencontrar a turma do Arouche numa safra temporã de quatro episódios do Sai de Baixo, parceria entre Viva e Globo. Se a moda realmente pegar, quem sabe logo ressurgem Juba e Lula em nova Armação Ilimitada, ou Rui e Vani já casados numa nova temporada de Os Normais?

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