Ferdinando Show é um desserviço à comunidade gay

Publicado em 10/08/2015

Estreou na noite desta segunda-feira (10) no Multishow, o Ferdinando Show, programa derivado do Vai que Cola, um dos maiores sucessos do canal pago. E talk show gay é a descrição que mais se encaixa para a atração estrelada por Marcus Majella – que “reprisa” seu personagem de Vai que Cola.

Ótimo humorista, Majella também se mostrou um competente animador de público. Suas apresentações como drag continuam afiadas e empolgantes, vide à abertura do programa, mas infelizmente todo seu talento é ofuscado pelo nível de humor apelativo da estreia, que funcionou como um desserviço à comunidade gay, já que trata de forma pejorativa os homossexuais.

O primeiro convidado foi a Bicha Bichérrima, um dos vários personagens afetados de Paulo Gustavo, que só falou bobagens em mais da metade do programa.

Tanto ele quanto Ferdinando fizeram questão de declarar, mais de uma vez, “amarem ser gays”, mas demonstraram isso atacando e rotulando o restante das “colegas”, que “carinhosamente” chamam de “bichas”. A Bicha Bichérrima fez até todo um monólogo para explicar a diferença entre ser gay e ser bicha… Ah, faz favor!

Não posso deixar de reconhecer o talento de Paulo Gustavo, mas só ele e no mundinho cor de rosa dele é legal – e correto – chamar um homossexual afeminado de bicha. Em pleno século 21. Não sou radical, nem confundo entretenimento com vida real, mas sabemos que existem muitas pessoas com a mente fechada por aí que ouvem da boca de um ator conhecido chamar um gay de “bicha” e vão achar que isso é normal. Algo que só fortalece o bullying e o preconceito.

Para a Bicha Bichérrima, ser “viado” também é normal. Aliás, a quantidade de “viado” que ele e o Ferdinando usam durante o programa quase supera a quantidade de fucks ditos nos filmes de Martin Scorsese. Precisa de tudo isso, denegrir ainda mais a imagem dos afeminados, como se a sociedade já não fizesse o bastante?

As lésbicas também não escaparam e foram comparadas, entre muitas outras definições tendenciosas, ao Capitão Nascimento, de Tropa de Elite. Mais um exemplo lamentável de homofobia às avessas.

Mas nem só de ataques o primeiro Ferdinando Show sobreviveu. Algumas – poucas – tiradas foram boas, como a da photoshopada Mariah Carey, bela e esbelta na capa do seu novo CD, mas que “na vida real parece que acabou de sair da churrascaria”, segundo a Bichérrima. “A Demi Moore tá muito velha” para ela, por isso “prefiro a Demi Lovato” também foi boa. De certa forma, porém, não deixa de ser uma espécie de ataque às celebridades…

Ferdinando Show é uma celebração da cultura gay, mas da pior maneira possível. A propósito, este que vos escreve é homossexual. Mas não me defino como bicha. Nem como viado. Apenas sou um ser humano. E esse programa não me representa.

© 2024 Observatório da TV | Powered by Grupo Observatório
Site parceiro UOL
Publicidade